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Pesadelo
Pesadelo
Chovia forte. Ele
caminhava depressa, mas seu sobretudo já estava completamente
encharcado. Se encontrava em um beco sujo, onde ratos barulhentos
pareciam rir dele quando passava. Ratos cujos dentes pontudos pareciam
sedentos por carne e sangue. Na verdade, estavam ali apenas em busca de
mais lixo para saborear, mas mesmo assim, ele não deixou de estremecer.
Afinal, nada
daquilo deveria estar acontecendo. Era um homem de sucesso, conhecido
pela sociedade. Não tão rico quanto se fazia parecer, mas, mesmo assim,
um homem de sucesso. Pelo menos para aqueles que o cumprimentava nas
festas em que frequentava. Para aquele que via no espelho, era alguém
que passou sua vida trapaceando, enganando, traindo, roubando.
Até que um dos
trapaceados resolveu pregar uma peça nele. Uma brincadeira sem graça,
digamos assim. Digamos que, nesta noite, fez uma visitinha à casa
dele...à sua esposa, mais especificamente. Foram cobrar uma dívida há
muito não paga. Deixaram-na bem feia. Aquele rostinho angelical, de
olhos azuis penetrantes, e seus cachos louro-dourados, desapareceram,
virando um emaranhado de fios, pele e vísceras, encharcados de sangue.
Ao chegar em casa e se deparar com aquela cena, ele ainda teve, lá no
fundo de sua mente, aquela piada de mau gosto ecoando, “parece o
macarrão à bolonhesa que a mama fazia nas noites de
quarta-feira, tão gostoso quanto o beliscão que ela dava em minha
bochecha, mandando eu comer tudo, seguido por um não menos delicioso
beijo melado de baba espessa”.
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A masmorra
A masmorra
O carcereiro, que estava sentado à mesa, ressonava. À frente dele, sobre o tosco móvel de madeira derribada à floresta, uma candeia ardia, dispersando precariamente a escuridão viscosa, que emanava das paredes bolorentas, e
a tudo envolvia, pesadamente, com o seu acre bafio. O vigia esquecera o
postigo do cárcere aberto; por isso, uma nesga azulada de luz chegava à
cela, adensava sobre nossas cabeças e depois morria, sufocada pela
treva úmida e cruciante.
O meu companheiro
de reclusão era jovem e moreno, como eu. Os olhos eram negros e
indolentes, mas uma chama atroz, por vezes, rutilava subitamente em suas
pupilas, e uma fisionomia absurdamente desumana assomava à sua face,
como se emergisse das camadas mais obscuras de sua alma. Isto também –
devo confessá-lo – vinha comigo; mas era ele, ao invés de mim, um rico e
poderoso boiardo, que pelejara, com galhardia, contra os otomanos.
Embora estivesse trancafiado há mais de uma semana, conforme eu
calculava juntando a cada inexorável amanhecer mais um nó aos cadarços
de minhas botinas, o jovem duque mantinha limpa e fresca a sua
indumentária de nobre, malgrado tivesse agora as barbas crescidas e os
cabelos oleosos em perene rebeldia. Juntos, parecíamos irmãos
consanguíneos. Mas as semelhanças esmaeciam quando confrontávamos as
nossas histórias.
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